Pesquisar este blog

domingo, 27 de outubro de 2013

GUIA PARA ASTROFOTOGRAFIA DE GRANDE CAMPO (WIDE-FIELD) 1º. PARTE - TRIPÉ FIXO



Nessa primeira parte, gostaria de falar um pouco sobre astrofotografia sem o uso equipamentos mais complexos, utilizando apenas uma câmera e um tripé simples para fotografia.


Imagem da região do cruzeiro do sul fotografado em Rafard/SP - 05.06.2013 - utilizando Tripé fixo e  uma câmera Nikon D5000 - ISO 3200 - 30 segundos de exposição

ESCOLHENDO OS EQUIPAMENTOS 

Como dito no início, vamos tentar usar o mínimo de equipamento. Muitas pessoas acham que esse tipo de fotografia só é possível com câmeras profissionais e montagens equatoriais que compensam a rotação da terra. Isso não é uma verdade, obviamente que uma boa câmera e uma montagem equatorial abrem um leque muito maior de possibilidades, mas é totalmente possível utilizar câmeras compactas para o serviço. Porém alguns requisitos mínimos são necessários.

TRIPÉ


Não há nenhuma exigência para este acessório, pode ser qualquer um que seja estável e suporte o peso da sua câmera.

CÂMERAS

Como já disse, se puder ter uma câmera DSLR essa é a melhor forma de se conseguir boas astrofotografias de grande campo, porém não é indispensável, as compactas e outros modelos de lente fixa podem ser um bom inicio.

As principais características que uma câmera para astrofotografia deve possuir são: 

Controle manual de ISO: Para quem não sabe, ISO é basicamente o controle sensibilidade a luz que câmera possui. Nas câmeras antigas o ISO (ou ASA) era modificado de acordo com a sensibilidade do filme, já nas câmeras digitais isso é feito aumentando eletronicamente o ganho do sensor. De modo simplificado, quanto mais alto o ISO utilizado, mais luz a câmera capta em menos tempo de exposição. Isso possibilita fotografar em ambientes com pouca luz. Abaixo temos duas fotos com o mesmo tempo de exposição, a primeira com ISO 200 e a segunda com ISO 6400, notem a diferença:

Imagem da esquerda ISO 200  / Imagem da direita ISO 6.400

Porém esse ganho traz um mal que todo equipamento eletrônico sofre quando é "sobre carregado", ele aquece. Esse aquecimento gera um efeito indesejável na fotografia chamado de ruído.  Ele é percebido nas imagens como um "granulado" (muito normal em fotos tiradas por celulares e outras câmeras mais simples em ambientes com pouca luz).
Podemos perceber claramente esse defeito nas fotos abaixo, onde na da esquerda foi usado um ISO 200 e na direita um ISO 6400.

Esquerda: ISO 200 e 30 segundos de exposição / Direita ISO 6400 e 1 segundo de exposição


Controle manual do tempo de exposição (velocidade do obturador):  Uma maneira de conseguir capturar mais luz sem causar muito ruído, como acontece com ISO alto, é utilizando o controle da velocidade do obturador, fazendo com que o obturador fique aberto por um período suficiente para que ele consiga captar luz para gerar a imagem.  Podemos comprovar isso utilizando novamente as imagens anteriores. Onde na primeira foi utilizado um ISO baixo (200) e 30 segundos de exposição e na segunda um ISO alto (6400) porém apenas 1 segundo de exposição, observem que ambas captaram quase a mesma quantidade de luz apesar da grande diferença de tempo, porém, a imagem feita com 30 segundos e ISO 200 possui uma qualidade muito superior, pois nela o ruído é baixo. 

O ideal seria possuir também controle sobre a abertura do obturador, quanto mais aberto, mais luz capta, o que ajuda na astrofotografia. Porém não é condição necessária. Logo, o que precisamos basicamente é ter controle do ISO e do tempo de exposição.  Uma boa câmera para astrofotografia deve permitir no mínimo 15 segundos de exposição. Aconselho fortemente as câmeras da marca Canon, para qualquer tipo de câmera (compacta, super zoom, DSLR), porém quando se trara de DSLR qualquer câmera vai possuir todos esses controles e muitos outros, sendo a Canon e a Nikon as mais indicadas para astrofotografia. (Eu uso uma Nikon, mas a preferência mundial para astrofotografia é a Canon).

Se for optar por uma câmera compacta, escolha uma Canon, pois elas permitem um controle manual fantástico, além de que, temos um grande amigo chamado CHDK que é um firmware que utilizamos para modificar (de maneira simples) essas câmeras compactas possibilitando usar tempos de exposição e ISO "sem limite". No final do artigo vou ensinar como fazer essa modificação.

DETERMINANDO A DATA E LOCAL

Provavelmente a determinação do local (sítio) e da data da fotografia é o principal fator para se conseguir um bom registro.

Local: Quando deseja-se fazer uma astrofotografia de espaço profundo, ou como é o caso, de grande campo, é desejável que você esteja o mais distante possível de fontes de luz. Portanto, se afastar dos centros iluminados da cidade é muito importante. Em cidades pequenas é possível conseguir algo bem razoável bem próximo das periferias, porém em grandes centros não tem outro jeito, é necessário dirigir alguns quilômetros para longe da cidade.

Data:  Quando me refiro a data, não falo sobre um período anual, mas sim mensal. Como falamos anteriormente é necessário fugir das luzes para se obter um bom registro, mas tem uma luz que infelizmente ou felizmente não podemos fugir em determinado período do mês.
A luz da lua, principalmente em sua fase cheia é um grande problema para captura de luz de outros objetos menos brilhantes como é o nosso caso, portanto, evitemos essa época.

Não posso deixar de falar que exitem épocas do ano que beneficiam, seja por possibilitar vermos partes mais densas da Via Láctea, seja por outros motivos, como períodos mais secos onde temos menos formações de nuvens. Portanto, como em qualquer modalidade de fotografia, é necessário fica na "espreita" de uma boa oportunidade.

Todas as fotos abaixo foram feitas utilizando a mesma configuração, a mesma câmera e com foco na mesma região da Via Láctea, as 3 demonstram as situações descritas acima, sendo que a primeira mostra a poluição luminosa no centro da pequena cidade de Rafard, a segunda a influência da luz da lua ainda no inicio de sua fase crescente, e terceira a visão do centro galáctico a 10 km da cidade.

Via Láctea e poluição luminosa da cidade

Via Láctea e luz da lua crescente


Via Láctea sem influência de luzes

EXECUTANDO A FOTOGRAFIA - EXPOSIÇÃO ÚNICA (1 FRAME)


Esse tipo de astrofotografia de grande campo é indicada para quando se deseja fotografar algum objeto que esteja na terra (uma construção, uma árvore etc ..) e ao fundo o céu.

Capela de Santo Expedito e  região do Cruzeiro do Sul  - Rafard/SP - Nikon D5000 -
30 s exposição - ISO 3200

Ipê e a região do Cruzeiro do Sul - Rafard/SP - Nikon D5000 -
30 s exposição - ISO 1600

Vamos ao que interessa, vejamos como devemos configurar a câmera para realizar as fotos:

Modo de captura: Manual ou se não disponível, um que possibilite o controle do tempo de exposição e ISO (algumas câmeras mais simples trazem essa opção como modo noturno).

Autofocus: Deixar desligado ou manual. Dica: O foco deve ser no infinito, use o foco automático para focar algum objeto distante na terra e quando focado desligue o auto focus.

Tempo de exposição: Como vimos acima, utilizar um ISO alto traz o problema do ruído, portanto vamos utilizar o máximo de exposição possível em conjunto com o ISO mínimo necessário para captar a luz com menos ruído. Mas como determinamos esse tempo máximo permitido?

Quando utilizamos um tripé fixo para astrofotografia nos deparamos com o maior problema que um astrofotografo possuí, o movimento de rotação da terra. Devido o movimento de rotação que é do oeste para o leste temos a impressão que os objetos no céu se movem do leste para o oeste, ou seja, nascem no leste e se põe no oeste. Apesar de ser aos olhos um movimento lento, quando fotografamos podemos perceber-lo com pouco tempo de exposição, Podemos nota-lo devido a ao problema que ele gera na imagem, "rastro" (trail), é exatamente o mesmo problema que temos ao fotografar algo em movimento , por exemplo quando fotografamos uma pessoa em um ambiente com pouca luz e ela se mexe fazendo com que a imagem fique "escorrida". Abaixo temos uma fotografia de 40 minutos em tripé fixo, que é uma outra modalidade de astrofotografia chamada de star trail, que serve exatamente para notarmos esse movimento de rotação. (Observem que o centro do circulo marca o polo sul celeste)

Star trail de 40 min de exposição
Tendo em vista esse problema, você já deve ter imaginado que existe um tempo máximo que podemos deixar a câmera fotografando para que isso não ocorra. Existe uma formula bem básica para calcularmos esse tempo máximo aproximado:

Tempo de exposição máximo = 600 / distância focal

Onde 600 é um coeficiente e a distância focal é a distância focal da objetiva ou do telescópio que está sendo utilizada. Por exemplo, se estamos utilizando uma câmera com uma objetiva 18-55 mm em 18 mm, poderemos regular o tempo de exposição para até 33 segundos (600/18). Lembrando que isso é um valor aproximado, câmeras compactas, que possuem um sensor menor, vão sofrer variação para baixo. O ideal é iniciar com esse tempo calculado, e fazer várias imagens diminuindo o tempo até que o trail não seja mais aparente.

Esse é um calculo básico e fácil de ser feito sem nenhum recurso, porém para quem deseja um cálculo mais preciso deixo a página de fórmulas do amigo e astrônomo José Agustoni (Zeca) , lá você vai encontrar, além dessa, uma infinidade de informações sobre astronomia e astronáutica. (Aprendi muita coisa com ele, vale a pena conferir).

ISO: Como já vimos anteriormente, o ISO vai nos ajudar a captar luz suficiente para que vejamos os detalhes dos objetos com pouca luz. Essa sensibilidade vária de câmera para câmera, portanto, a melhor forma de estipular o ISO a ser utilizado é realizar a mesma foto com o mesmo tempo de exposição e ir variando o valor do ISO para posteriormente escolher qual ficou melhor. Geralmente para este tipo de fotografia o ISO utilizado fica entre 800 e 3200. (Eu sempre faço pelo menos uma com 800, uma com 600 e outra com 3200)

Redução de ruído para ISO alto e longa exposição: Se sua câmera possuir essas opções, deixe-as ligadas. Com a opção da redução de ruído a foto levará o dobro do tempo, pois ele realiza uma segunda foto com o obturador fechado para realizar um processo chamado de subtração de dark frames, o qual não entrarei em detalhes de neste momento. Posteriormente explicarei como se faz isso através de softwares específicos.

Abertura do obturador: Deixar na máxima possível.

Distância focal: Aconselho usar a mínima possível (no caso das compactas, "sem zoom"). Pois assim podemos fotografar um campo mais amplo além de captar mais luz.

Formato da imagem: Caso exista a opção de imagem em formato raw, sempre utilize essa opção, caso não tenha, deixe na melhor qualidade possível.

Balanço de brancos: Se o formato da imagem for raw, o balanço de brancos não é importante, pois o mesmo será ajustado no tratamento da imagem. Caso seja em outro formato, ajuste para luz do dia em lugares sem poluição luminosa e para tungstênio caso esteja em um lugar com poluição luminosa.

Atraso do obturador ou trava do espelho: Essa opção é disponível e necessária somente para câmeras DSLR, pois evita que o tranco na hora de levantar o espelho da frente do sensor faça a câmera vibrar.

TRATANDO AS IMAGENS

Depois de uma longa noite de capturas espetaculares, o trabalho ainda continua. Não vou entrar em detalhes específicos sobre tratamento, pois é assunto que demanda um artigo inteiro, porém vou tentar passar alguma noção básica.

Provavelmente uma imagem bem feita, já será bem impressionante até mesmo sem nenhum tratamento, porém a imagem tem um ganho gigantesco quando se aplica o mínimo de tratamento, assim como pode ser visto nas imagens abaixo.


Imagem da direta sem tratamento e esquerda com tratamento, basicamente ajuste de curvas, níveis, balanço de cores


O software a ser utilizado pode ser qualquer editor de imagens que possibilite ajustes como curvas, níveis, balanço de cores, brilho e contraste etc. É muito comum o uso do famoso Photoshop, porém existe milhares de outras opções, inclusive algumas gratuitas. (Para quem não tem muita experiência com tratamento de imagens o Adobe Photoshop Lightroom é bem simples, intuitivo e traz excelentes resultados, principalmente quando se trata de imagem em formato raw).

Basicamente o que você vai fazer é fazer uma cópia do arquivo original (para não ter perigo de estraga-lo), abrir em um desses editores de imagem e ir aplicando os ajustes citados anteriormente até que a imagem fique do seu gosto. Dica: Vá duplicando os layers antes de ajustes significativos, assim você pode ir comparando os resultados antes e depois.

Finalizamos então essa primeira parte sobre astrofotografia. Na próxima parte falaremos sobre o mesmo tipo de astrofotografia, porém explicarei como registrar e processar múltiplas imagens ao invés de apenas uma, conseguindo assim fotografar objetos com pouca luminosidade, assim como galáxias e nebulosas.

CHDK CANON


O CHDK é um programa que possibilita utilizar recursos avançados na maioria das câmeras da família Powershot da Canon. É muito útil, e o melhor é que ele não altera o firmware original da câmera, você vai apenas carregá-lo no cartão de memória e utilizar quando for conveniente.

1º.)  Acesse o site http://chdk.wikia.com/wiki/CHDK e procure pelo modelo da sua câmera. Faça o download do firmware .

2º.) Extraia o conteúdo do download dentro do cartão de memória utilizando um leitor de cartão. Observação: é necessário utilizar o leitor de cartão, se você acessar o cartão através do usb da câmera não vai funcionar.

3º.) Insira o cartão na câmera e ligue-a mantendo pressionado o botão play (botão que você usa para visualizar as imagens na câmera). Obs: Se você ligar com o botão liga e desliga normal a câmera não carregar o CHDK.

4º.) Algumas câmeras possuem várias versões de firmware. Você vai observar que quando extrair o conteúdo para o cartão, vai ter um arquivo chamado "vers.req" ou "ver.req" dependendo do modelo da sua câmera. Este arquivo permite ver a versão do firmware da sua câmera entre outras informações. Caso você verifique que o firmware baixado não confere com a versão da sua câmera, volte ao site e faça o download do firmware correto. (Obs: Não ocorre nenhum problema ao carregar um firmware incorreto, apenas não funciona)

Para visualizar a versão, mantenha o botão "Set"  pressionado e pressiono o botão "Display" se você continuar com o botão "Set" pressionado e continuar pressionando "Display" você visualizara outra informações como o numero total de fotos que a câmera já fotografou até a presente data.

Se tudo correu bem, sua câmera já vai estar rodando o CHDK. Ainda com a câmera ligada no modo Playback, pressione o botão menu, vá até a opção "Firm Update", opção que agora deve estar disponível. Se não visualizar essa opção, tente pressionar novamente o botão Playback 2 vezes, esperando 2 segundos entre uma e outra.

Quando selecionado a opção "Firmware Update" sua câmera inicializara o CHDK. Para ligar a câmera e carregar o CHDK sempre ligue utilizando o botão Playback.

Para acessar as opções avançadas do CHDK, pressione o botão de "atalho" da sua câmera e aparecerá um peque "<ALT>" na parte inferior da tela, ai basta pressionar a tecla "Menu" para acessar as opções do CHDK, caso queira acessar as opões padrão do menu, basta pressionar novamente a tecla de atalho, o "<ALT>" vai sumir e você terá acesso ao menu original novamente.

Se você quiser que toda vez que você ligue a câmera, o sistema carregue o CHDK, você deve acessar o menu do CHDK, procurar pela opção "Debug Parameters", dentro dessa opção selecione "Make Card Bootable..." e pressione a tecla "Set". Remova seu cartão de memória e mova a trava de proteção contra gravação para a posição bloqueada, volte o cartão na câmera. Agora toda vez que você ligar a câmera ele carregara o CHDK, se quiser que inicialize normalmente, basta voltar a trava para posição destravada.

19 comentários:

  1. Fantástico meu amigo... é disso que os leigos precisam para ter coragem de iniciar a astrofotografia. Fica aqui meu muito obrigado..

    ResponderExcluir
  2. Parabéns, Grande Leandro, logo, logo, veremos o resultado em toda astrofotografia.

    ResponderExcluir
  3. Respostas
    1. Obrigado Marcel, desculpe-me por só ter visto sua mensagem agora.

      Excluir
  4. Foi muito útil para mim toda essa explicação, obrigado pela paciência e boa vontade em compartilhar conhecimento... parabéns.

    ResponderExcluir
  5. Excelente trabalho!
    Irei divulgar esse material, sendo um dos mais completos sobre o assunto!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Obrigado Cleber, desculpe-me por só ter visto sua mensagem agora.

      Excluir
  6. Leandro, parabéns! 👏 👏 👏 👏
    Qual a lente utilizada?

    ResponderExcluir
  7. Leandro, parabéns! 👏 👏 👏 👏
    Qual a lente utilizada?

    ResponderExcluir
  8. Espetacular! Parabéns pelo post.

    ResponderExcluir